Escolha uma opção:

sábado, 29 de junho de 2013

Um salto

Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo...
Fernando Pessoa

Na minha vida passei por muitas coisas, que se tornaram importantes lições.
A melhor delas?
Aprender a levantar!
JGCosta


Clique na imagem para ver de onde ela veio!


Um salto


O que me afastava do sucesso não era um degrau, eram vários, com nomes, sobrenomes e apelidos ridículos criados em minha mente, tentando diminuir a inferioridade que me assolava.
Depois de anos eu ainda aparentava ser invisível, desprezível, indiferente, antipático, e mais alguns predicados que não ouso mencionar. Tudo que eu queria era um lugar ao sol, a chance de progredir, mas toda vez que eu dava um passo a frente, vinham-me os tropeços causados por esses seres míseros, me mandando, tal num tabuleiro, para duas casas atrás.
Recordo-me bem do meu maior voo, embalado num projeto de um viaduto que levei semanas para concluir, onde pensei em cada detalhe, refiz cada fórmula, testei todas as possibilidades. Consegui convencer meu chefe de que o trabalho era único, algo notável, passei para o próximo passo, envolvi o gerente com todas as garantias de que, desta vez, não haveria erros. Ele me levou pessoalmente para nos reunirmos com o diretor executivo. Fiz uma brilhante apresentação que encantou aos dois, ficaram boquiabertos com todos os recursos que expus, a economia do negócio, a sustentabilidade, foi inevitável: marcamos com o presidente da firma.
Uma semana depois, lá estava eu defronte ao senhor mais baixinho e feio que já havia visto na vida, com uma carinha de anão da Branca de Neve, para lá de teimoso. Pedi que filmassem o meu desempenho, creio que nunca havia sido tão brilhante como até aquele momento, nenhuma falha, um mínimo tropeço no linguajar, passei uma hora explanando todos os detalhes do projeto. No final fui aplaudido e ovacionado de pé pelo empreendimento que eu sugerira, que na minha mente seria um marco na história da empresa. O único que não se deu nem ao trabalho de levantar foi o dublê de anão. Bateu duas palmas e foi embora, levando meu sorriso com ele.
Descobri, após alguns dias, depois de todos aqueles “não foi desta vez cara”, que eu não precisava de um projeto idiota sobre um viaduto, almejava mesmo um arranha-céu, de onde pudesse dar um salto rumo a minha paz de consciência, deixando para trás o gosto da derrota que amargava minha boca. Seria rápido e indolor, deixaria uma simples carta de despedida para a família e fim, somente um ser lamuriante a menos no mundo.
Demonstraria nessa carta com toda a clareza quais foram os responsáveis por meu ato suicida, todos aqueles incompetentes do escritório que só visavam lucros para suas contas gordas, ah, isso eu deixaria sublinhado em letras garrafais.
Mas antes de seguir em frente nessa noite, preciso de uma bebida, é tarde, sei que todos dormem lá em casa. Vou atacar meu próprio barzinho, não vou correr o risco de encher a cara, desabafar com um garçom qualquer e acordar no outro dia, ainda vivo, com uma tremenda ressaca.
Vou aproveitar para ver o meu último ato, aquela apresentação estonteante, enquanto tomo um bom conhaque... – Mas o que é que isso? Conheço essa letra...
“—Pai, me desculpa a sinceridade nesse bilhete, mas você não é desse jeito, como parece nesse vídeo. Você sempre fala de uma forma mais simples, devagar, com carinho. Está mais parecendo um executivo arrogante. Se eu fosse seu chefe não lhe daria a promoção...”
Normalmente eu lhe daria umas palmadas, de brincadeira, é lógico, por essas observações, mas ele desenhou uma carinha sorrindo depois da última palavra, esse é meu filho...
E quem é que me conhece melhor do que ele, não existe outra pessoa nesse mundo, nem mesmo sua mãe. Assisti ao filme novamente e novamente, e ele está certo, aquele não sou eu, somente estou atuando um papel que não me pertence. Bom, só resta fazer mais uma coisa...
Aqui estou eu de novo, mais um dia de trabalho defronte o computador e sorrindo feito bobo. O presidente me chamou agora a pouco e só me pediu para que simplificasse um pouco as coisas, tornasse meu projeto um pouco mais natural, mas que este era de fato formidável e seria inserido nos principais trabalhos da empresa. Nunca tinha percebido o quanto ele é amável!

Pois é, ainda bem que o meu melhor amigo me alertou num bilhete que é na simplicidade das coisas que encontramos a verdadeira fórmula do sucesso. Nesse dia em questão aprendi que não precisava superar ninguém que estivesse no me caminho, a não ser eu mesmo.