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segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Então é Natal... (reedição)

Bom dia meus amigos!

Tive que dar uma melhorada no texto abaixo, para que o mesmo se adaptasse à um concurso literário específico. Como foi somente depois de ler profundamente nas entrelinhas que descobri a necessidade de um texto inédito, compartilho com os amigos o resultado da modificação.

Meus mais sinceros abraços renovados!

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Então é Natal...

Existia uma bela escola onde estudavam os alunos mais simples daquela cidadezinha do interior paulista, que não tinha mais do que 30 mil habitantes na época. Ela fora construída no topo de um morro, inteiramente de tijolinhos a vista, e destoava dos casebres simples e na sua maioria de madeira, que a cercavam por todos os lados.
Alguém que olhasse de longe diria que ali se encontrava um castelo com o povoado ao redor, mas creio que se pensarmos bem e fizermos uma simples analogia, poderemos constatar que essa visão não fugia muito da realidade, afinal, onde se concentrava antigamente toda a cultura e riqueza de um povo, senão atrás das muralhas de uma fortaleza, que no nosso caso distinto abrigava o saber.
Provavelmente esse estabelecimento de ensino ainda existe ou repousa pintada num quadro qualquer ou ainda na lembrança de algum morador da região...
Nessa escola, desde o ano de 2000, a diretoria era comandada pela Sra. Berta, considerada como uma pessoa extremamente rígida, principalmente pelos alunos que a visitavam, após realizar as suas costumeiras travessuras em salas de aula. No fundo era uma pessoa doce, que criara uma imagem mais dura para impor respeito àquela escolinha da periferia, mãe e avó dedicada, voluntária em inúmeros projetos sociais do município.
Como em todos os finais de ano, incentivou aos professores das classes que correspondiam ao primeiro e segundo ano do ensino fundamental que, próximo à data natalina, solicitassem aos alunos a confecção das famosas Cartas para o Papai Noel. E como sempre, dezenas de cartas das mais variadas se acumularam na sala dos professores, numa mesa que fazia divisa com um presépio maravilhoso, que era confeccionado peça por peça e montado nos primeiros dias de dezembro, por um simpático senhor que já iremos conhecer.
Depois dessa primeira fase de recebimento das cartas, seguindo uma regra, escolhiam entre elas àquelas que achavam serem as mais criativas e providenciavam a visita do Papai Noel em suas residências, papel esse sempre desempenhado pelo Sr. Osmar, um senhor aposentado do bairro onde estava instalada a escola, que também fora um exímio marceneiro. Bom, ele ainda o era, pois a aposentadoria não lhe diminuíra a habilidade em tornear e grosar as madeiras, já que todo o ano renovava ou acrescentada novos integrantes ao belíssimo presépio da escola.
Nesse ano de 2010, faltando apenas duas semanas para o Natal, a professora Isabel do primeiro ano A levou ao conhecimento da diretora uma das trinta cartas que recebera e, segundo ela, deveria ser a escolhida de sua classe.
A diretora, que dada a sua postura profissional descrita anteriormente, não assinava abaixo de nada que não tivesse minuciosamente lido anteriormente, tomou a carta para si, onde leu a seguinte narrativa:

“Oi seu Papai Noel!
Meu nome é Marcos, mas me chamam de Marquinhos, pois sou magrinho e pequeno demais para os meus 9 anos.
Estou escrevendo essa cartinha somente porque a professora mandou, creio que pode até valer nota pela criatividade, mas acho que não vai adiantar nada, pois sei que não existe nenhum bom velhinho que anda por aí, voando de renas e descendo por chaminés. Existem sim boas pessoas que se vestem de vermelho e tentam levar um pouco de alegria onde ela raramente existe, através de brinquedos e de uma enxurrada de balas...
Falando nisso, já que estou fazendo a carta mesmo, bem, na verdade estou ditando a carta, não sei escrever muito bem ainda, minha prima Lucia é quem está fazendo isso por mim, pois ela me deve um favor, coisa de um namoro escondido que eu prometi guardar segredo... Mas então, como eu estava falando de presentes, não custa nada dizer que eu gostaria muito de ganhar uma bicicleta. Não precisa ser de marcha muito menos de alumínio, mas tem que ser grande, de preferência com aro de 20 polegadas, para que eu a aproveite por bastante tempo, afinal sei que não conseguiremos comprar uma tão facilmente, as prioridades da minha família são outras e muito mais essenciais.
Mas esse desejo aí foi antes de ver minha mãe rezando alguns dias atrás...
Para que o senhor entenda, preciso explicar que moro num barraco de madeira em cima de um morro, bem perto da escola, eu, minha duas irmãs, uma de 1 ano e meio e a outra com 3, mais um irmão de 5, e a minha mãe que nos sustenta através da coleta de recicláveis. O meu pai? Não sei onde ele anda, sumiu antes da caçula nascer.
Nosso barraco tem um cômodo só, onde minha mãe dorme numa cama de solteiro com a caçulinha e nós três dormimos num colchão de casal.
Foi numa dessas noites que vi minha mãe rezando ajoelhada em frente da santinha. Ela pedia que nesse fim de ano conseguíssemos ter uma ceia de verdade e não o costumeiro arroz com feijão seco. Até aí não tem nenhuma novidade, ela sempre nos diz que devemos ter esperança e continuar acreditando, que quando crescermos quem sabe poderemos juntar um bom dinheiro e comprar uma casa de verdade ou até aumentar o barraco, e que devemos principalmente pedir isso todos os dias para Deus, em oração antes de dormir.
O que me fez mudar de opinião quanto à bicicleta que eu queria ganhar foi que, nesse dia em particular, ela rezava chorando e quase não conseguia dizer as palavras, parecia estar desesperada demais ou desacreditada, não tenho certeza.
Logo ela que eu nunca vi chorar.
Vê-la assim me fez pensar que tudo aquilo com que estávamos acostumados, fruto da miséria em que vivíamos não era então uma coisa normal como ela sempre fez questão que acreditássemos.
É por isso que, ao invés de um presente único para mim, eu gostaria agora de ganhar algo para toda a minha família, quem sabe um peru recheado, que eu nem sei que gosto tem, acompanhado por panetones e outras coisas que são necessárias para essa tal de ceia de Natal.
O senhor me desculpe por ter sido sincero lá no início em dizer que não acredito que você exista, mas uma coisa eu sei: Deus Existe! Foi Ele que Me tocou naquela noite que minha mãe estava ajoelhada e me fez ver que algumas coisas serão sempre mais importantes que outras, e tenho certeza também que é esse Bom Deus que também toca os vários corações daquelas pessoas que todos os anos se vestem de vermelho e saem por aí distribuindo presentes e jogando balas de cima de seus carros enfeitados.
Se o que eu pedi for demais, não tem problema, como eu disse já estamos acostumados com essa nossa vida e é claro que existem outras pessoas ainda mais carentes do que nós, por mais que isso me seja impossível de imaginar. Nós com toda a certeza conseguiremos sobreviver a mais um Natal, pode ser que existam outros que nem tenham tanta sorte, e sendo assim pode transferir o meu desejo para eles, sem pensar duas vezes.
Acho que quando eu crescer eu também vou me transformar num Papai Noel, pois me imaginei um “tantinho” assim no seu lugar e isso me deixou muito mais feliz...”

A diretora após ler a carta tentou disfarçar de todo jeito as lágrimas que rolavam pela sua face, mas ao olhar de lado viu a professora Isabel chorando ainda mais do que ela mesma e se deixou levar pela emoção. Abraçaram-se e após conseguirem se acalmar um bom tempo depois, decidiram colocar aquele pedido como prioridade.
Tudo foi arranjado para que na véspera de Natal o Sr. Osmar fosse visitar a família de Marquinhos, levando consigo uma ceia completa e uma bela bicicleta azul. Infelizmente, devido a esses acasos que teimam em acontecer, por volta das 13 horas na véspera o Sr. Osmar veio a falecer de um infarto fulminante, que dizem ter sido fruto daquela obesidade que já o vinha acompanhando há bem mais de 10 anos.
Com esse fato, tendo ocorrido muito em cima da hora, todos os eventos que a escola planejará para o Natal foram automaticamente cancelados, para tristeza dos professores, principalmente de uma chamada Isabel.
Quase um ano depois o menino Marcos, agora no segundo ano e já escrevendo melhor, fez de próprio punho uma nova carta para o Papai Noel que começava mais ou menos assim:

“Oi seu Papai Noel!
Lembra de mim, é o Marquinhos! Minha mãe lhe manda lembranças!
Esse ano se não for pedir demais eu gostaria de ganhar um computador, afinal a bicicleta azul ainda está novinha...”

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